31 agosto 2013

O poeta das rosas

   Nascia no dia onze de Outubro de mil novecentos e oito, no bairro do Catete, um brasileiro de nome Angenor de oliveira. Esse brasileiro entrou para a história da música popular brasileira pelo carinhoso apelido de Cartola. Pretendo nessa pequena biografia contar um pouco mais sobre a história desse grande personagem de nossa cultura. Usarei vasta discografia para auxiliar-me a contar a vida desse grande poeta.

   Aos onze anos de idade Cartola e sua família se viram obrigados, devido às condições financeiras, a irem morar no Morro de Mangueira zona norte do Rio de janeiro. Como o futuro ira mostrar esse lugar vai servir de inspiração para os versos de nosso poeta.

   “Alvorada lá no morro, que beleza /Ninguém chora, não há tristeza /Ninguém sente dissabor” (Alvorada).

   Seu pai, Sebastião Joaquim de Oliveira, ensinou Cartola desde pequeno a manusear e a tocar diversos instrumentos musicais, indo de cavaquinho ao violão. O carnaval sempre esteve presente na vida de nosso poeta, era costume da família de Angenor desfilar no bloco carnavalesco  Rancho dos Arrepiados. Não por acaso as cores do bloco (verde e rosa) foram colocas como cores oficiais da escola de samba fundada por Cartola.

   “É branco o sorriso das crianças / São verdes, os campos, as matas / E o corpo das mulatas quando vestem Verde e rosa, é /Mangueira” (Verde que te quero Rosa).

   Obrigado a trabalhar desde muito cedo Angenor passou por vários empregos, e foi como auxiliar de pedreiro que ganhou o apelido (Cartola) que vai lhe acompanhar pelo resto de sua vida. O apelido foi dado pelo fato de Angenor usar um chapéu “coco” durante a obra, o chapéu tinha como objetivo evitar que restos de cimento caíssem sobre sua cabeça. O mundo do trabalho também vai estar representado nos versos do compositor:

   “Se o operário soubesse / Reconhecer o valor que tem seu dia / Por certo que valeria
Duas vezes mais o seu salário / Mas como não quer reconhecer / É ele escravo sem ser/  De qualquer usurário” ( O samba do operário)
   Angenor somente concluiu o ensino fundamental e aos 15 anos de idade perdeu sua mãe. Aos 17, por não agüentar as constantes brigas com o pai, saiu de casa. E assim iniciou sua vida de boêmio carioca.

   Em 1928 Angenor ao lado de Saturnino Gonçalves, Massu, Zé Espinguela, Euclides dos Santos, Pedro Caim, Abelardo Bolinha deram início à escola de samba Estação primeira de mangueira. O nome deve-se ao fato de ser a Estação ferroviária de Mangueira ser a primeira parada, partindo da central do Brasil, a possuir uma Escola de samba. A letra do primeiro samba enredo de mangueira foi composto por Angenor e cantada pos seus companheiros:

   “Chega de demanda / Chega! / Com este time temos que ganhar / Somos da Estação Primeira /Salve o Morro de Mangueira” (Chega de demanda)

   A década de 1930 foi para cartola, que devido à qualidade de suas composições, uma época de resplendor. Ele passou a despertar o interesse de diversos cantores da época. Grandes artistas do rádio como, Francisco Alves, passaram a procurar Angenor com o propósito de comprar algumas de suas composições. “Divida dama” foi o primeiro samba de Angenor a ganhar repercussão no meio artístico da época.

   A Segunda Guerra Mundial já havia começado e, buscando apoio dos países latino-americanos, os Estados Unidos puseram em prática a chamada política da boa vizinhança. Em 1940, atracou no Brasil o navio Uruguai, que trazia a bordo o maestro inglês Leopold Stokowski. Além de fazer duas apresentações no Rio de Janeiro, o regente reuniu no navio artistas populares, trazidos por Villa-Lobos, com o intuito de fazer gravações para o Congresso Pan-Americano de Folclore. Cartola estava entre os compositores escolhidos e gravou quatro sambas no disco “Columbia presents – native Brazilian music – Leopold Stokowski”, lançado nos Estados Unidos pouco tempo depois.

   Mesmo com tanta visibilidade Angenor não conseguia se manter apenas com a musica sendo obrigado a fazer seus “bicos”. Em 1946 Angenor foi acometido por uma terrível meningite que o fez parar de compor e trabalhar. Foi graças a Deolinda que Angenor pode se recuperar e a voltar a compor. Infelizmente um ano após ela veio a falecer devido a um ataque fulminante no coração.

   Depois da morte da Esposa Angenor acabou por cair nas mãos de Dónaria, a mulher responsável por tirar do Morro de Mangueira seu mais genial compositor. Cartola foi residir com ela no morro do Caju. O relacionamento tempestuoso não durou muito e Angenor acabou voltando para a Mangueira ao lado de Euzébia Silva do Nascimento (zica), mulher com a qual Angenor viveu até o último dia de vida. Podemos perceber que esse momento de sua vida ficou gravado em seus versos:

   “Para ter uma companheira /Até promessas fiz /Consegui um grande amor/ Mas eu não fui feliz/ E com raiva para os céus/ Os braços levantei / Blasfemei / Hoje todos são contra mim” (Sim)

   Com muito trabalho e ajuda de amigos, Angenor, abriu em 1963 o Zicartola, um restaurante que reuniu durante alguns anos os maiores sambistas do Rio de Janeiro como Paulinho da Viola. Ele era localizado no coração da boemia, a Rua da Carioca. Foi nesse espaço que em 1964 Angenor e “Zica” realizaram sua festa de casamento. O espaço fechou suas portas em 1965.

   O maior fruto gerado pelo Zicartola veio no ano de 1974 quando Marcos Pereira deu a Angenor a possibilidade de gravar seu primeiro LP solo. Nesse LP Angenor cantou seus dois maiores sucessos “O mundo é o moinho” e “As rosas não falam”.

   "Ouça-me bem, amor /Preste atenção, o mundo é um moinho / Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho /Vai reduzir as ilusões a pó" (O mundo é um moinho)

   "Queixo-me às rosas,/ Mas que bobagem/As rosas não falam/Simplesmente as rosas exalam/O perfume que roubam de ti, ai" (As rosas não falam)

   Sua genialidade foram finalmente reconhecida fato que possibilitou a Angenor viver de maneira confortável os últimos anos de sua vida. O grande mestre Cartola morreu no ano de 1980, aos 72 anos.



Valdeir Conegundes


Fontes e link para as musicas

CARTOLA. Fita meus olhos. Rio de Janeiro: Uerj/Departamento Cultural. Fundação Museu da Imagem e do Som, 1998.

MOURA, Roberto. Cartola, todo tempo que eu viver. Rio de Janeiro: Corisco Edições, 1988.

SILVA, Marília T. Barboza da & OLIVEIRA FILHO, Arthur L. de. Cartola: os tempos idos. 2ª ed. Rio de Janeiro: Funarte/INM/DMP, 1989.


Saiba Mais - Documentário:
“Cartola – Música para os olhos”, de Lírio Ferreira e Hilton Lacerda. Brasil, 2006.

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